A Paris de Luc Besson em “Angel-A”
O diretor
francês Luc Besson (1959), de "Subway”, “Nikita”, “O profissional”,
"O Quinto Elemento", etc, é sem dúvida uma fábrica de filmes,
acumulando nos últimos anos créditos como diretor e como produtor ou produtor
executivo de filmes.
Se você
curte Paris, certamente neste filme você vai “passear” por ela de uma maneira
inusitada e cativante. Luc Besson sempre foi conhecido por sua inventividade
visual, e com a fotografia de Thierry Arbogast em preto e branco de Angel-A
(2005) não é diferente. Ângulos inusitados de cima e de baixo de Paris,
panorâmicas formidáveis dos cartões-postais da Cidade Luz, o fetiche
fashionista com formas femininas esguias e uma tremenda glamourização de uma
realidade como se estivéssemos lendo um editorial de moda.
O filme
acompanha um malandro incompetente e mitômano, André (o popular ator de comédia
francês Jamel Debbouze, o Lucien de “Amélie Poulain”), que deve dinheiro a
bandidos em toda Paris. Os cobradores estão no seu encalço, André se desespera,
nem a polícia aceita prendê-lo para garantir sua segurança. O personagem
principal em "Angel-A" é a própria Paris, mas o filme também
apresenta uma história contundente de um homem arrasado e pequeno (Jamel
Debbouze) e uma mulher alta e loira chamada Angela (a atriz dinamarquesa Rie
Rasmussen de "Femme Fatale").
“Angel-A”
almeja ser um “Asas do Desejo” pop, e Luc Besson, que talvez não seja um Wim
Wenders, tenta nos mostrar uma mescla de plasticidade exuberante com um drama
existencial. O filme propõe uma ideia - o desamor de André, descendente de
argelinos com cidadania estadunidense, que se confunde com a crise de
identidade de Paris - mas Besson explicita a redenção de André com tanta força no
filme que inevitavelmente simpatizamos com ele desde o começo, apesar de
apresentar-nos um final com um inexplicável lugar comum. O filme traz muitos
monólogos e diálogos existenciais numa tentativa do cineasta de demonstrar que
é muito mais que um esteta no cinema. Mas talvez os melhores momentos da
carreira do cineasta foi quando não colocou o discurso à frente do filme,
tempos de entretenimentos plenos como “O Quinto Elemento” (1997).
No
filme, Paris é uma cidade de cores diurnas suaves; até mesmo a luz do sol é
tingida de cinza, um efeito que o diretor de fotografia Thierry Arbogast capta
lindamente, como na cena em um cruzeiro no Sena, mais parecido com Paris que
desejamos do que com a Paris concreta, de modo que o filme às vezes destila a
essência de um lugar que se se consolida no nosso imaginário. O visual
memorável do filme envolve uma criatura alada suspensa no ar acima do rio, e
sua beleza vem principalmente do fato de a cidade estar atrás em preto e
branco. A cor certamente teria feito tudo muito literal, se é que podemos usar
essa palavra para descrever uma imagem.
O
devedor então decide se matar. Mas quando vai se jogar da Ponte Alexandre III,
um anjo entra em sua vida. André tem um problema de jogo, aliado ao alcoolismo
e o vício em drogas, e está prestes a se atirar de uma ponte terrivelmente
formidável no Sena, quando ele percebe que uma platinante figura, não tão
angelical como veremos mais adiante no filme, está prestes a fazer a mesma
coisa - como se fosse ofuscar sua iniciativa. Depois de resgatá-la das águas
que correm sob a ponte, André e a misteriosa mulher descobrem que ambos têm
muito mais coisas em comum do que imaginam. Eles argumentam, ele a salva (ou
ela o salva) e eles fazem as respectivas missões para curar as falhas de
personalidade e questões de autoestima. E é claro também os problemas de dívida
de André.
A ponte
Alexandre III é sem dúvida uma das grandes personagens do filme, em estilo
Beaux-Arts, com suas exuberantes lâmpadas Art Nouveau e seus querubins, ninfas
e cavalos alados. Foi construída no final do século XIX. Recebeu o nome como
homenagem ao czar Alexandre III, que havia concluído a Aliança Franco-Russa alguns
anos antes. A ponte foi inaugurada em
1900 para a Exposição Universal, assim como o vizinho Grand Palais e o Petit
Palais.
O filme não quer ser nada além do que é e carrega suas referências de outros filmes precedentes. Neste caso, há um brilho de "Asas do Desejo" (1988), de "Splash – uma sereia em minha vida" (1984) e de "A vida é Maravilhosa" (1979), com alusões fugazes a "Forrest Gump" (1994) e "Pulp Fiction" (1995) jogadas por razões que você provavelmente não deveria pensar demais ao ver o filme.
Assim como o refrigerante com gás e a pipoca que compramos para assistir, esse filme passa pelo seu sistema sem causar muita impressão, embora possa ser vagamente agradável e alguns momentos de uma maneira não particularmente satisfatório quando você exige uma obra prima da cinematografia. Mas tudo bem...há algo neste trabalho que o diferencia: no filme existe uma Paris que pertence aos nossos sonhos, a cidade encantadoramente vazia num alto contraste em preto e branco luzidio que nunca enxergaremos ao visitá-la. A magia de “Angel-A” está na “construção” deste nosso imaginário, uma visão maravilhosamente onírica da Cidade Luz, e esta talvez seja o resultado que se perpetua para que quem assiste o filme de Luc Besson.
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