English French German Spain Italian Dutch Russian Portuguese Japanese Arabic Chinese Simplified

A Paris de Luc Besson em “Angel-A”

Postado por ARQUITETURA E CINEMA em segunda, fevereiro 25, 2019



     O diretor francês Luc Besson (1959), de "Subway”, “Nikita”, “O profissional”, "O Quinto Elemento", etc, é sem dúvida uma fábrica de filmes, acumulando nos últimos anos créditos como diretor e como produtor ou produtor executivo de filmes.

Se você curte Paris, certamente neste filme você vai “passear” por ela de uma maneira inusitada e cativante. Luc Besson sempre foi conhecido por sua inventividade visual, e com a fotografia de Thierry Arbogast em preto e branco de Angel-A (2005) não é diferente. Ângulos inusitados de cima e de baixo de Paris, panorâmicas formidáveis dos cartões-postais da Cidade Luz, o fetiche fashionista com formas femininas esguias e uma tremenda glamourização de uma realidade como se estivéssemos lendo um editorial de moda.

O filme acompanha um malandro incompetente e mitômano, André (o popular ator de comédia francês Jamel Debbouze, o Lucien de “Amélie Poulain”), que deve dinheiro a bandidos em toda Paris. Os cobradores estão no seu encalço, André se desespera, nem a polícia aceita prendê-lo para garantir sua segurança. O personagem principal em "Angel-A" é a própria Paris, mas o filme também apresenta uma história contundente de um homem arrasado e pequeno (Jamel Debbouze) e uma mulher alta e loira chamada Angela (a atriz dinamarquesa Rie Rasmussen de "Femme Fatale").

“Angel-A” almeja ser um “Asas do Desejo” pop, e Luc Besson, que talvez não seja um Wim Wenders, tenta nos mostrar uma mescla de plasticidade exuberante com um drama existencial. O filme propõe uma ideia - o desamor de André, descendente de argelinos com cidadania estadunidense, que se confunde com a crise de identidade de Paris - mas Besson explicita a redenção de André com tanta força no filme que inevitavelmente simpatizamos com ele desde o começo, apesar de apresentar-nos um final com um inexplicável lugar comum. O filme traz muitos monólogos e diálogos existenciais numa tentativa do cineasta de demonstrar que é muito mais que um esteta no cinema. Mas talvez os melhores momentos da carreira do cineasta foi quando não colocou o discurso à frente do filme, tempos de entretenimentos plenos como “O Quinto Elemento” (1997).

No filme, Paris é uma cidade de cores diurnas suaves; até mesmo a luz do sol é tingida de cinza, um efeito que o diretor de fotografia Thierry Arbogast capta lindamente, como na cena em um cruzeiro no Sena, mais parecido com Paris que desejamos do que com a Paris concreta, de modo que o filme às vezes destila a essência de um lugar que se se consolida no nosso imaginário. O visual memorável do filme envolve uma criatura alada suspensa no ar acima do rio, e sua beleza vem principalmente do fato de a cidade estar atrás em preto e branco. A cor certamente teria feito tudo muito literal, se é que podemos usar essa palavra para descrever uma imagem.

O devedor então decide se matar. Mas quando vai se jogar da Ponte Alexandre III, um anjo entra em sua vida. André tem um problema de jogo, aliado ao alcoolismo e o vício em drogas, e está prestes a se atirar de uma ponte terrivelmente formidável no Sena, quando ele percebe que uma platinante figura, não tão angelical como veremos mais adiante no filme, está prestes a fazer a mesma coisa - como se fosse ofuscar sua iniciativa. Depois de resgatá-la das águas que correm sob a ponte, André e a misteriosa mulher descobrem que ambos têm muito mais coisas em comum do que imaginam. Eles argumentam, ele a salva (ou ela o salva) e eles fazem as respectivas missões para curar as falhas de personalidade e questões de autoestima. E é claro também os problemas de dívida de André.

A ponte Alexandre III é sem dúvida uma das grandes personagens do filme, em estilo Beaux-Arts, com suas exuberantes lâmpadas Art Nouveau e seus querubins, ninfas e cavalos alados. Foi construída no final do século XIX. Recebeu o nome como homenagem ao czar Alexandre III, que havia concluído a Aliança Franco-Russa alguns anos antes.  A ponte foi inaugurada em 1900 para a Exposição Universal, assim como o vizinho Grand Palais e o Petit Palais.

O filme não quer ser nada além do que é e carrega suas referências de outros filmes precedentes. Neste caso, há um brilho de "Asas do Desejo" (1988), de "Splash – uma sereia em minha vida" (1984) e de "A vida é Maravilhosa" (1979), com alusões fugazes a "Forrest Gump" (1994) e "Pulp Fiction" (1995) jogadas por razões que você provavelmente não deveria pensar demais ao ver o filme.

Assim como o refrigerante com gás e a pipoca que compramos para assistir, esse filme passa pelo seu sistema sem causar muita impressão, embora possa ser vagamente agradável e alguns momentos de uma maneira não particularmente satisfatório quando você exige uma obra prima da cinematografia. Mas tudo bem...há algo neste trabalho que o diferencia: no filme existe uma Paris que pertence aos nossos sonhos, a cidade encantadoramente vazia num alto contraste em preto e branco luzidio que nunca enxergaremos ao visitá-la. A magia de “Angel-A” está na “construção” deste nosso imaginário, uma visão maravilhosamente onírica da Cidade Luz, e esta talvez seja o resultado que se perpetua para que quem assiste o filme de Luc Besson.


Tags: a paris de luc besson em “angel-a” paulo leônidas revista ópera design 

Arquitetura e Cinema


Paulo Leônidas é arquiteto (Ufrgs)/ Warsaw University/ Architectural Association AA Especialista em Arquitetura Habitacional (Propar/Ufrgs) Mestrado Arquitetura (Propar/Ufrgs) Atuou até 1993 como professor na Escola de Arquitetura (Ufrgs). Pesquisador do tema “Cinema como Arqueologia da Arquitetura”. A partir de 1994 inicia na área do cinema, Diretor de arte, cenógrafo de grandes redes de televisão e Diretor de cena, roteirista de longas e curtas metragens, documentários e também séries para tv, atividade que desempenha até o momento. Em 2015 lança, em parceria com o historiador Carlos Pereira, o romance histórico: “1844: Romeu e Julieta”. Realiza diversas curadorias de exposições e publica diversas críticas, tais com artigos e ensaios, sobre a Arquitetura e o Cinema.

Categorias